Há momentos em que uma cidade precisa levantar a cabeça, encarar o abismo e dizer, sem rodeios: basta. São Francisco do Conde chegou exatamente a esse ponto. E o responsável tem nome, CPF, gabinete e assinatura — Antônio Calmon, o prefeito que transformou o município mais rico da Bahia em um laboratório de improvisos, caos e humilhação coletiva. A denúncia de impeachment protocolada na Câmara não é apenas um documento jurídico. É um raio-x da decadência moral, da falência administrativa e da completa incapacidade de governar e de passar o poder lhe legitimado nas urnas para outros. É o retrato impiedoso de um gestor que rasgou leis, ignorou decisões judiciais, perseguiu a própria população e tratou os mais pobres como descartáveis, se valendo da certeza da impunidade.
Descartáveis. Porque é isso que faz um prefeito que suspende, sem qualquer justificativa legítima, um programa de combate à fome — o Pão na Mesa — logo após as eleições, como quem desliga uma lâmpada. Quando a Justiça determina o restabelecimento do benefício, ele cruza os braços, debocha da ordem e deixa famílias inteiras à míngua, acumulando multas diárias de R$ 25 mil como quem coleciona troféus de arrogância. Deixa milhares de funcionários sem receber há dois meses, mesmo tendo arrecadado quase R$ 100 milhões. Isso não é ineficiência nem erro: é crueldade administrativa. E crueldade, em política, sempre cobra seu preço.
Calmon há muito tempo perdeu qualquer traço de vergonha administrativa. Transformou programas sociais em armas políticas; servidores em massa de manobra; e toda uma cidade em refém da sua própria vaidade. Cada nova revelação — e são dezenas — deixa claro que o projeto dele não é para São Francisco do Conde. É para si, para a “dama” e seus familiares. O escândalo envolvendo o genro milionário, o operador “Papito ou Palito” e contratos de merenda milionários e franquias não é acidente — é sintoma. Sintoma de um governo baseado em portas fechadas, interesses cruzados, alianças sombrias e uma teia que mistura negócios privados com dinheiro público sem pudor.
Enquanto isso, crianças andam quilômetros por rodovias, escolas fecham por falta de ônibus, pescadores e marisqueiras ficam sem Auxílio Defeso, estudantes perdem bolsas universitárias, salários atrasam, a merenda vira moeda de troca, as ruas se enchem de lixo, o hospital estacionário vira contrato milionário com empresa de eventos e a cidade, outrora orgulho da Bahia, se esfarela como barro seco. São Francisco do Conde nunca esteve, tão maltratada e tão humilhada.
Em algum momento — e talvez nem ele saiba quando — Calmon deixou de ser prefeito. Virou gerente de crise. Depois virou criador de crise. Hoje, é refém dela. A captura da máquina pública é tão evidente que o editorial poderia parar aqui. Mas não para, porque o buraco é mais embaixo. Quando um prefeito descumpre decisões judiciais, desvia finalidades orçamentárias, abandona políticas sociais, colapsa o transporte escolar e ainda debocha da fome do povo, o problema deixa de ser administrativo. É moral. É ético. É humano. Calmon não governa. Calmon se esconde.
A ocupação da Câmara, a coleta de assinaturas, a revolta nas ruas, os vídeos de estudantes caminhando por quilômetros, a fúria das mães e o desespero dos trabalhadores não nasceram do acaso. São fruto da certeza de que algo podre se instalou no coração do governo municipal. Nasce também da sensação de que, se a sociedade não reagir agora, talvez não haja cidade para reconstruir depois. São Francisco do Conde, antes símbolo de orgulho regional, virou motivo de vergonha nacional.
O impeachment não é um pedido — é uma necessidade. A peça apresentada à Câmara é clara, robusta, documentada e devastadora. Não é política, é técnica. Não é opinião, é fato. Não é perseguição, é sobrevivência institucional. Calmon não cometeu apenas erros — cometeu escolhas. Escolhas que feriram a legalidade, ignoraram decisões judiciais, prejudicaram quem mais precisa e destruíram a dignidade da cidade. São Francisco do Conde não aguenta mais sofrer.
A cidade pede socorro. O povo grita. E o impeachment deixa de ser uma saída política para se tornar a “única” saída moral para os vereadores eleitos para representar o povo. Ou Calmon cai, ou a cidade cai junto. O futuro não espera. A Justiça não pode esperar. E o povo já esperou além do limite. É hora de virar a página. É hora de recuperar a cidade das mãos de quem a sequestrou moralmente. É hora de São Francisco do Conde voltar a ser do povo — e não de um projeto pessoal falido, desesperado e já politicamente morto. O fim chegou. Agora falta apenas a Câmara reconhecer o óbvio.











