A crise da saúde em São Francisco do Conde não para de ganhar contornos de filme de terror com a publicação tardia do 5º Termo Aditivo ao Contrato nº 203/2022, referente ao chamado Hospital Estacionário. O documento foi publicado apenas em 16 de dezembro de 2025, mas estabelece efeitos retroativos com início em 20 de abril de 2025. Para especialistas em direito público, a prática levanta fortes indícios de ilegalidade e pode ter sido utilizada para viabilizar pagamentos retroativos sem a devida cobertura legal.
O aditivo prorroga a vigência do contrato firmado com a empresa *Soul Eventos Ltda.* para locação e operação da estrutura provisória do hospital, mantendo o mesmo objeto e sem a apresentação de redimensionamento financeiro proporcional à fase contratual.
O problema central está no prazo: termos aditivos devem ser formalizados e publicados até o quinto dia útil do mês subsequente de sua assinatura sob pena de nulidade. A publicação extemporânea, com efeitos retroativos, afronta os princípios da legalidade, publicidade, transparência, moralidade e segurança jurídica, previstos no art. 37 da Constituição Federal e reiterados na legislação de licitações.
Juristas do Jornal Candeias explicam que aditivo publicado fora do prazo não pode convalidar despesas já realizadas, tampouco autorizar pagamentos retroativos. Em tese, a prática pode configurar ato administrativo inválido, despesa sem cobertura contratual, violação à Lei de Licitações (Lei nº 8.666/93 à época dos primeiros aditivos e Lei nº 14.133/2021), além de possível ato de improbidade administrativa, por permitir a saída de recursos públicos sem respaldo jurídico regular. Em casos mais graves, o gestor pode responder por infração político-administrativa, nos termos do Decreto-Lei nº 201/67 e ser aberto mais um processo de
Impeachment, no caso de Calmon, o 3º.
O episódio se torna ainda mais escandaloso quando comparado à realidade da rede de saúde do município. Enquanto o contrato de reforma do Hospital Célia Almeida Lima está paralisado por falta de pagamento, mesmo com mais de R$ 10,5 milhões já pago, o contrato da tenda provisória segue sendo prorrogado e ampliado. Levantamentos apontam que, somados o contrato original e os sucessivos aditivos, o custo do hospital estacionário pode ultrapassar R$ 40 milhões, ou seja, quatro vezes o valor da reforma do hospital definitivo. Um verdadeiro escândalo.
Para técnicos da área, trata-se de uma inversão completa de prioridades: o equipamento permanente, essencial para a cidade, está parado; o provisório, que deveria ser temporário, transformou-se em um contrato interminável e milionário, e uma grande investigação precisa ser feita. A publicação tardia do aditivo reforça a suspeita de que o instrumento foi usado apenas para “regularizar” pagamentos já realizados ou a realizar, ampliando o ralo por onde o dinheiro público escoa.
O caso também reacende as denúncias sobre a ausência de transparência, já que não há planilhas públicas de custos, cronogramas físico-financeiros atualizados ou justificativas técnicas para a manutenção dos valores integrais após a montagem completa da estrutura. Especialistas destacam que, uma vez instalada a tenda, os custos subsequentes deveriam se limitar à operação e manutenção, o que exigiria redução significativa dos valores, sob pena de sobrepreço oculto ou superfaturamento.
Diante desse cenário, a saúde de São Francisco do Conde permanece em estado crítico. Com a reforma do hospital parada, a tenda custando cifras astronômicas e agora um aditivo retroativo publicado fora do prazo, cresce a pressão para que os órgãos de controle aprofundem a apuração e avaliem as responsabilidades.
Para a população, a sensação é de abandono; para o direito administrativo, o episódio representa um alerta vermelho. A pergunta que fica é simples e grave: quem vai responder pelo contrato provisório que virou permanente e milionário? Até quando a justiça vai permitir que o povo de São Francisco do Conde permaneça sofrendo?













